Na China comunista, ondas curtas são uma janela para o mundo
Para gerações de chineses, as
transmissões de rádio de ondas curtas têm sido por vezes a única fonte
de notícias independente e honesta sobre o que ocorre ao redor do mundo e
até mesmo dentro da própria China.
Na década de 1960, durante a Revolução
Cultural, era crime ouvir as transmissões de ondas curtas da Voz da
América (VOA): a rádio foi chamada de “uma estação inimiga” na
propaganda comunista chinesa. Amy Xue, que era adolescente na década de
1960 e que agora trabalha num escritório de advocacia em Washington DC,
disse que a VOA era sua única fonte de notícias real durante o período
caótico e tumultuado.
“Eu estava com medo e excitada”, quando
ela ouviu a VOA pela primeira vez com fones de ouvido grandes e
robustos, presenteados por um primo que trabalhava num escritório de
telégrafo estatal. Num rádio de ondas curtas de marca Panda – que era
bom, segundo Xue, pois era fornecido pela Xinhua, a agência de notícias
estatal – Xue ouviria aulas de inglês, bem como notícias sobre os
Estados Unidos e os desenvolvimentos na China.
Parte da missão da VOA na época era
ajudar a “evolução pacífica” da China, uma frase odiada pelo Partido
Comunista Chinês (PCC) e vista como equivalente a um pedido de
destruição do regime. Xue disse que tinha medo de ser pega ouvindo a
VOA, mas que os locutores soavam “muito amigáveis e tinham vozes
suaves”.
“Era muito diferente do material
revolucionário do Partido Comunista, que era extremista e duro”, disse
Xue. Ela soube via VOA sobre a morte prematura de Lin Biao, que até
então fora o seguidor mais confiáveis do presidente Mao, num acidente de
avião na Mongólia. “Fiquei chocada. Eu não podia acreditar na notícia.
Poucos dias depois, a escola nos reuniu e revelou o ocorrido.”
Anos mais tarde, a VOA foi novamente
fundamental para uma nova geração na China: os estudantes universitários
do fim da década de 80 que estiveram envolvidos ou sabiam dos protestos
pró-democracia na Praça da Paz Celestial.
David Tian, um desenvolvedor associado à
coalizão anticensura ‘Global Internet Freedom Consortium’ e um
cientista da Universidade de Maryland, disse que as transmissões de
ondas curtas da VOA eram a única maneira que ele e seus colegas podiam
acompanhar o que acontecia diariamente durante abril, maio e junho de
1989, quando ocorreu a repressão militar e o fuzilamento dos estudantes,
manifestantes e residentes em Pequim.
“Mesmo antes, na década de 1980, quando
eu estava na faculdade, ouvir as ondas curtas da VOA foi uma ótima
maneira de aprender inglês”, disse Tian.
Durante o movimento da Praça da Paz
Celestial, “praticamente todos que não estavam fisicamente na praça
estavam grudados nas ondas curtas do rádio por todo o desenvolvimento”,
disse ele. Naquele ponto, ouvir as transmissões de ondas curtas que não
fossem propaganda já não era crime, embora o regime chinês
frequentemente interferisse no sinal. “Era muito difícil conseguir um
sinal claro”, disse Tian. Mas quando alguém tinha um bom sinal, seu
quarto do dormitório ficaria lotado, com Tian e seus colegas ouvindo as
transmissões da VOA pela noite adentro.
Após o massacre estudantil em 1989, a interferência era “muito, muito ruim”, disse Tian.
Sem a VOA, Tian e seus colegas estavam
completamente no escuro sobre os eventos que ocorriam na China. Ninguém
acreditava em nada do que a televisão e as rádios estatais reportavam
sobre os eventos na Praça da Paz Celestial. “Essa era uma fonte crítica.
Nós realmente confiávamos na VOA. Mas não confiávamos em nada do que o
PCC dizia.”
O mais recente beneficiário das
transmissões de ondas curtas na China é o conhecido advogado cego chinês
e ativista dos direitos humanos Chen Guangcheng, que depois de sua
soltura da prisão foi imediatamente colocado em prisão domiciliar pelas
autoridades em sua aldeia de Linyi, província de Shandong.
No entanto, Chen teve permissão de ouvir
transmissões de rádio de ondas curtas. Em entrevistas recentes em
Taiwan, Chen disse que, para as massas de chineses que não tem
computador, “as transmissões de ondas curtas são excelentes, pois os
ajudam a entender as notícias do mundo exterior. É simples e conveniente
e difícil de restringir.” Ele acrescentou que há um “mercado enorme”
para as ondas curtas na China e que esse veículo ainda é
“importantíssimo”.
Numa entrevista em março, Chen fez
referência específica à emissora de ondas curtas Rádio Som da Esperança
(SOH), que tem estado ocupada recentemente com o desmantelamento de uma
das estações de retransmissão de ondas curtas que ela usa, operada pela
emissora nacional Rádio Taiwan Internacional (RTI). A SOH diz que
derrubar a estação de retransmissão Tianma prejudicaria seus esforços de
transmitir para a China. A RTI diz que o movimento foi planejado há
anos e que não teria qualquer impacto.
Chen Guangcheng disse a SOH que, a
partir de 2008, a SOH se tornou tão importante quanto a Rádio Free Asia
na radiodifusão para a China. “Eu escutava a SOH constantemente quando
eu estava na China”, disse Chen recentemente em Taiwan. “Devido ao
trabalho árduo da SOH, a qualidade da transmissão era muito boa… a SOH
falou claramente sobre coisas que as pessoas não haviam considerado
anteriormente. Eles tornaram muito fácil para nós entender por que a
China não é um lugar justo.”
Epoch Times

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